#15 Um guia para permanecer conectada (e não enlouquecer)
Nesta carta eu falo sobre algumas decisões que estou maturando desde o final do ano passado com relação às redes sociais.
Oi, oi! Eu sou a Dia e essa é uma newsletter com intenção de blog. Me dedico mais às questões sobre escrita, literatura, saúde mental, mas vez ou outra você vai ler um drama desabafo pessoal também. ;)
Já há algum tempo ando cansada das redes sociais e nos últimos três meses estive menos ativa. Em dezembro fiquei totalmente offline, voltei timidamente em janeiro e pensei seriamente no que fazer com esses perfis, uma vez que dependo deles para divulgar o lançamento do meu próximo livro.
Quanto mais pensava, mais crescia a sensação de que eu sou só um grão de areia no meio de tantos outros. Muita gente falando a mesma coisa, os temas se repetindo à exaustão e no final, só o que dá engajamento é foto seminua e dancinhas (nada contra quem faz): duas coisas que não tenho a menos vontade de postar.
Ah, também tem quem sobreviva de conteúdos polêmicos ou coachirizados (essas palavra existe?). Algumas pautas se tornaram muito cansativas para mim, ainda mais, quando vejo pessoas que se aproveitam da ingenuidade de outras para ganhar em cima, por exemplo, perfis que ensinam fórmulas mágicas para obter sucesso, perfis de coachs no geral, não importa a área.
Vidas fakes cheias de ostentação também já me esgotaram: pessoas que vivem de ostentação; posts com clickbaits ou com mensagens dúbias e contraditórias; posts de autoaceitação e amor próprio (esses pra mim, são os piores porque nunca me parecem muito sinceros). Falando assim pareço uma pessoa amarga, eu sei. Mas não é isso. Não tenho nada contra expor a felicidade nas redes, só acho que estou cansada de ver tudo tão padronizado, simétrico e sem graça feito harmonização facial que deixa todo mundo parecendo o Clark Kent.
Então resolvi experimentar: reduzi em quase 70% a frequência dos meus posts. Comecei eliminando os posts que mostram minha vida íntima, com amigos, família e relacionamento, restringindo-os ao espaço close friends. Não produzi mais posts de “conteúdos”, pois quero concentrar esse material na newsletter. Resumi os posts aos comentários de leitoras sobre meu livro, trechos do meu livro ou citações de autoras, fotos esporádicas de livros que estou lendo e algumas fotos profissionais que fiz exclusivamente para esse fim.
Com isso, flopei bastante; perdi um montão de seguidores e o engajamento foi para a cucuia. Paciência.
Por outro lado, a sensação de frustração desapareceu e me sinto muito mais tranquila.
Por que você escreve posta?
Estar nas redes pode ser muito desgastante e ficar fora delas pode desencadear o F.o.M.O. Ficamos entre a cruz e a espada. Como todo mundo que escreve e publica, eu quero ser lida, mas hoje em dia, parece que antes de tudo, precisamos ser vistas. Não sei se isso é real ou se é uma ilusão minha, mas acho que as redes podem ser boas aliadas na divulgação de livros. No entanto, buscar leitores é uma tarefa difícil para quem não tem um grande nome ou dinheiro para promover os posts e financiar o engajamento. É um trabalho de formiga que nunca acaba.
Ser lida também envolve vender livros. Longe de mim romantizar o ofício. Não podemos esquecer de quantos escritores e escritoras fantásticas morreram na penúria por não saberem administrar as suas carreiras (Carolina Maria de Jesus, Orides Fontella, Cassandra Rios, Lima Barreto, etc). Mas eu confesso que, às vezes, eu queria fazer como a Elena Ferrante e publicar sem ninguém saber quem eu sou. Infelizmente, sabemos que o mercado brasileiro não funciona assim.
Sim, dinheiro é importante. Nem só de curtidas e compartilhamentos de posts vive uma escritora. Acreditem, os boletos também chegam para a gente e muitas escritoras precisam trabalhar em outras funções para poderem ter uma renda digna. Viver de escrita no Brasil envolve fazer muitas coisas além de escrever e estar presente nas redes implica certa assiduidade nas postagens e isso pode ter um custo emocional bem alto.
Quando alguém (pelo menos, das escritoras que conheço) diz que “vive de escrita”, isso significa que além de escrever seus livros, ela trabalha como ghost writer, copywriter, faz revisão, preparação e leitura crítica de textos de outras pessoas, escreve projetos para editais, vende os próprios livros no boca a boca, investe em outras artes como pintura, colagem, etc. Muitas conciliam esses trabalhos com a vida acadêmica, como eu.
Além de tudo isso, ainda existe a ideia de que arte não é trabalho. Sabe aquela revista ou blog que pede textos pra “te divulgar”? Pois é. Qualquer manifestação artística requer investimento em tempo, energia, material de trabalho, etc.. A melhor forma de você divulgar e valorizar uma artista é pagando pela obra/trabalho dela. A pandemia do corona vírus mostrou que sem arte estaríamos perdidas.
O fato é que amo escrever. Escrever é meu respiro, minha fuga, uma forma de elaborar o mundo e dar sentido a tudo isso que vivo, que vivemos. Como escrevo, quero ser lida. Me recuso a devolver meus textos para a caixa em que eles ficaram guardados por tanto tempo. E para ser lida, preciso conquistar meu espaço junto aos leitores e leitoras. O fato é que esta tarefa pode ser bem cruel e testar nossos limites. Afinal, vale tudo para vender um livro?
Eu não tenho resposta para isso e algo que venho ponderando ultimamente é: eu quero ser uma artista ou uma empreendedora? A literatura é minha arte ou o meu negócio? Dá para fazer os dois? Quais os limites éticos que enfrentamos para divulgar nossa arte? Não sei. Talvez alguém entre vocês possa me responder.
Dito isto, descobri algumas coisas e fiz um guia para mim mesma:
Não produzir conteúdo sem alma só para não perder seguidores;
Buscar pessoas que dialoguem comigo;
Não quero fãs, quero compartilhar experiências;
Momentos mais íntimos ficam no close friends porque não estou disposta a expor pessoas queridas (eu já exponho muitas coisas por aqui);
Não seguir quem não interessa só por uma dinâmica de reciprocidade, que não é sincera;
Acreditar que meus livros encontrarão suas leitoras e leitores sem que eu precise vender minha alma ao diabo;
Quem quiser continuar me seguindo pela minha escrita, va bene, se não, bye bye
Acho que manter a humildade e o pé no chão é fundamental neste processo.
Não existe uma fórmula de sucesso e nós não devemos ser obrigadas a fazer algo que não queremos ou que não nos faz bem. Acredito muito no trabalho lento que prospera ou como dizia minha avó: “é melhor ser um abacateiro que demora para dar frutos, mas dura uma vida inteira do que uma bananeira que frutifica rápido, mas só produz uma vez”.
P.s: Essa Newsletter quase não sai porque este mês estou empenhada na edição do meu livro de não ficção e as aulas na universidade voltaram, então meu tempo ficou reduzido. Mas como já estava rascunhada e eu já havia dito que ia falar sobre isso, resolvi trazer meu desabafo para vocês.
Outras prosas
Minha indicação deste mês é o livro da Tove Divtlesen: Trilogia de Copenhagen traduzido por Heloisa Jahn e Kristin Lie Garrubo publicado pela Companhia das Letras. A primeira e a terceira parte são preciosas.
Assisti o polêmico Poor Things de Yorgos Lanthimos ou “Os bixim” como chamamos aqui no Pernambuco e gostei muito. A fotografia é belíssima e a Emma Stone, sem comentários.
Na próxima newsletter, creio que seguirei a dica da
e escreverei sobre Pesquisa/Dicas para fazer uma boa pesquisa para um texto. Minha base é toda acadêmica, então estou estudando um pouco mais como fazer isso para a ficção. Pode demorar um pouco, mas já comecei a rascunhar.
Agradeço demais a você que chegou até aqui. Eu adoraria saber mais o que achou da minha prosa. Você pode responder diretamente a este e-mail ou deixar um comentário.
Nos vemos em breve,
Com amor e cansaço,
Dia Nobre
Dia, essa news poderia ter sido escrita por mim no sentido de que eu concordo com cada linha que vc escreveu, eu me sinto exatamente assim em realação ao instagram, mais especificadamente, eu sei quais seriam as "formulas" mas n tenho vontade de seguir, quando eu fazia posts mais motivacionais era pq eu realmente queria, pq estava passando por aquelas situações e escrever e postar sobre o que sinto era algo que fazia desde 2009 com meu blog. mas agora quando colocam isso como um modelo, uma forma de estrategia, eu perco o tesão. n consigo pensar em meus posts serem milimetricamente programados e estrategicos para ter "sucesso" eu gosto do espontaneo pq sempre escrevi na internet dessa forma. Eu resolvi postar so o que quero e gosto sem planejar muito e tem me feito bem assim. Brigada por essa news, me fez sentir que to no caminho certo, que é o de me ouvir e pensar no meu bem-estar.
Me identifiquei demais. Além de todas essas questões que você trouxe, ainda me pegam mais duas coisas: a primeira é essa coisa de usar a vida social como moeda de troca para vender o meu trabalho – isso inclui expor as pessoas próximas e também acaba com o tempo de qualidade. A segunda, é que as redes sociais ganharam status de "TV". Pessoas normais criando conteúdo independente "competem" com equipes multidisciplinares e equipamentos profissionais. É cruel e o algoritmo não está nem aí pra isso.